sábado, 27 de julho de 2013

"Fardo"







Olhe só no que nos metemos! Embutimos o prazer da presença, num acúmulo de conforto e desapego.
Pois então meu amo e Senhor, caça-te novo rumo de vida, nova sina, nova rima, novos amores...
Já esquecestes, pois, tanto gasto, já tanto trabalho terminado, tanto doado, tanto abraço, tanto fardo? Me diga meu amo e Senhor!
Cito então a musa, repito a rima já clichê do poeta delgado, enriqueço pois, a fala e repito alto a maldição que me assola... nome seu. Maldito seja!
Me afasto arrastado pra longe, almejando do meu canto fúnebre a volta, desejando de minha carne já morta o restauro, assim como sinto que não mais se importas se é vida ou morte...
Anjo recaído! Percebo os anseios de seu coração, sinto o moldar de suas fases, trocando de pele o rastejante hospedeiro desconhecido. Consuma-o! Não o perca de vista, não o deixe entrar e tomar espaço, por favor eu imploro louca alma vagante, mate-o enquanto ainda é fraco! Antes que me mate eu, de tão fraco...
 
 
 
 
Ayron B.


quarta-feira, 8 de maio de 2013

"O que são palavras?"

 
 
O que são todas essas palavras que a tempos ouço, sem traduzir sentido algum? De que tipo são os vocábulos inexplicados regurgitados indefinidamente, causando som estrondoso de dor? Cala-te pobre alma! Emudece-te pobre espírito drogado, divinamente fadado ao luto eterno...
Quem ouço vindo de longe, com contos antigos, já recém-diagnosticados incertos? Quem mudamente canta a mandinga xamânica, tecendo com língua afiada, cordéis de mentira plena, as não verdades mal ditas?
Cala-te ó cipó de aroeira! Larga o lombo do pobre coitado. Não açoite com lástimas e mágoas quem lhe deu perdão. Excomunga então, liberta, alforria!!!
Mendigando então ainda vou, por palavras afortunadas, de brilho barato e sintético, cedidas por lábios enriquecidos, antes por mim merecidos, frutos de tão grande amor...
 
 
Ayron B.
 

quarta-feira, 13 de março de 2013

"O Desertor"





Cego voo eu, caminhando sobre o ar que leva faceiro o cotidiano do viver. Corro de canto a canto do mar, nado sem rumo, sem prumo ou pudor, nado sem canseira...
A vida tem sido um fluxo inconstante de êxtases homeopáticos, de curtos períodos de um hemorrágico fluir do que vem de dentro e se eterniza lá fora.
Calam-se os lábios então, do pobre coitado que clama por cura, por abrigo, por um porto seguro...
Viver já não é como costumava ser. Solicita-se então curriculum vitae, histórico escolar, exame de DNA, para comprovar a aptidão do desesperado para se manter sobre a superfície.
A morte então já não parece tão ruim aos olhos do desgraçado já desertor, a ponto de abandonar a si próprio, a seu eu, seu ego, sua raça.
Canto então, alegremente , rejubilo-me ao recordar, que existe mais, muito mais a esperar, por uma pobre alma, já vazia e tão cansada, da batalha que é existir e continuar...



Ayron B. 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

"Morto Vivo"


Te vi nu, cru, insosso, ateu, frívolo, cálido, morto. Vivo... Perseguindo-me com mãos fúnebres e putrefatas, decompostas, urrando por vísceras, clamando por intermináveis sessões de horror, devassidão e luxúria. 
Corri puro, só, vago, sátiro, esperto. Corri pra longe da morte que o trazia em desesperado fulgor, lutando para viver, golpeando-te de longe para que não me ferisse.
Deparei-me súbito contigo. Arrepios são meras sensações de formigamento quase insensíveis, quando agora se está nos braços de um sanguinário maldito. Um morto vivo que grita alto, que ruge por sangue quente, por pulso, por luto.
A luta é vã quando se trata de um monstro sobrenatural, terrorista do passado, montado em erros antigos que agora , supostamente não deveriam ter valor, mas são caros. Paga-se um preço altíssimo.
Correr não faz sentido, esconder-se tão pouco. Cabe então render-se ao hábito, ao bafo quente do suspirar da morte que se aproxima já montada, já armada, assassina.
Rendo-me então ao seu hálito de podridão, que ao poucos seduz, levemente conduz, ao sepulcro já preparado, limpo e adornado, para um, como eu, pobre coitado, descanso eterno de nós. Me entrego ao defunto andante, ao meio-vivo, terror galopante, que aos poucos me suga, me devora, me consome, tentando por mais uma vez, sentir o prazer de provar de mim, do meu amor, meu pudor, minha tristeza, até meu fim.



Ayron B.